sexta-feira, 6 de junho de 2014

O barbeiro [ V ]

O BarbeiroEntre, entre, esteja à-vontade. O seu casaquinho pode ficar ali, no cabide da frente e depois faça a fineza de se sentar.

Venho arranjar as unhas - disse-lhe o cliente.

O barbeiro olhou-o de soslaio. Não estranhou os traços. Talvez algum cliente antigo que, por qualquer acaso ou circunstância, deixou as redondezas e voltou para saciar a saudade.

Senhor... - reticenciou o barbeiro na esperança de conseguir uma pista.

E o cliente sem lhe satisfazer o sibilo: - Quero que as unhas sejam aparadas pela Gisela e envernizadas pela Turquesa.

- Lamento, Senhor... mas já não tenho esteticistas nem manicuras no meu estabelecimento. Esses fantásticos tempos de massagens e acepipes já lá vão e agora nem unhas se arranjam aqui porque a minha arte não chega a tanto. Posso dar-lhe um acerto na nuca e um aparo nas patilhas?

- Na cara não toque, deixe as patilhas! Trate da nuca que depois hei-de fazer as unhas em lugar adequado. Preciso delas a brilhar para quando tiver de as mostrar.

O Sr. Luís fez o que tinha a fazer, recebeu o que lhe era devido, facturou o que a lei manda, acompanhou o cliente à porta porque lhe sobrava tempo e voltou a tentar o sibilo mas não conseguiu matar a curiosidade. A narrativa das unhas a brilhar e os traços da cara que não estranhou por mais que escavasse na memória deixou-o intrigado. Quem seria o gajo?

Encolheu os ombros e resignou-se.
LNT
[0.216/2014]
Imagem: http://www.gutenberg.org/

Sem comentários: